sábado, 29 de setembro de 2012

Chicabom

Hoje, quando acordei, fui à cozinha beber água e acabei vendo uma caixa de Chicabom no congelador. Me veio ao paladar a lembrança do gosto do picolé, e à mente o sabor da minha infância. Dona Márcia, minha mãe, sempre comprava para mim uma caixa e deixava lá, guardada, para quando eu quisesse pegar.

Chicabom tem gosto de infância, bem como os bolos de chocolate que a minha avó fazia ou as deliciosas macarronadas que o meu pai preparava tão divinamente bem.

É engraçado como coisas banais para mim àquela época, hoje têm um significado de memória, que lembram quanto carinho eu tenho por aqueles tempos. São coisas que nos deparamos e pensamos: "poxa, eu adorava isso quando era criança!".

Outro dia eu estava passando os canais e vi no Telecine o filme dos Power Rangers. Movido por alguma força desconhecida, acabei assistindo, eu, um marmanjo com barba na cara e quase 20 anos nas costas. Recordei-me das brincadeiras que eu fazia nas escadas do antigo prédio em que morei, ou mesmo quando me mudei para o interior. Como era maravilhoso jogar bola na praça, debaixo da chuva, até que o vigia aparecesse para nos expulsar.

Mas se teve algo que marcou minha infância, provavelmente foi o segundo filme do Batman dirigido pelo Tim Burton, aquele em que aparecia o Pingüim e a Mulher-Gato. Perdi as contas de quantas vezes assisti aquele filme, fosse alugando em VHS (e tendo que rebobinar após assistir) ou quando passava na Sessão da Tarde. A cena do beijo da Mulher-Gato com o Batman e a morte do Pingüim, bem como aquele clima obscuro de Gotham, sempre estarão presentes na minha memória.

Acho que apesar dos pesares, minha infância do final dos anos 90 e começo dos anos 2000 até que foi boa.

(Não sei bem por que escrevi esse texto, mas tive que expressar de alguma forma o que senti quando vi a caixa de Chicabom no congelador).

domingo, 23 de setembro de 2012

Reticências.

Somos fruto das merdas que vivemos, amadurecemos com nossos erros e nossas decepções. No fim das contas Sartre tinha razão, o que importa é o que faremos com aquilo que fizeram de nós.

sábado, 22 de setembro de 2012

Incógnitas.

Pegou a chave do carro e uma carteira de Marlboro.

A estrada parecia curta, dirigia a 140km/h no meio da madrugada. Uma hora e meio litro de uísque depois, ouvindo Rammstein no volume máximo, chegou à fazenda do avô. Teve momentos felizes ali, agora a casa grande estava abandonada, praticamente em ruínas.

Foi fácil arrombar a porta de madeira. Não havia luz, procurou algumas velas e acendeu todas. Cheirou cinco gramas de cocaína. Só tinha mais três cigarros.

Achou alguns remédios vencidos no banheiro, tomou alguns. A garrafa de uísque já estava quase no fim. Pegou o antigo rifle do seu tio que sempre ficava em baixo da cama, a caixa de munição estava numa cômoda.

Sentou numa cadeira, colocou a boca no cano do rifle e apertou o gatilho com o dedão do pé.

(Por que ele fez isso?)

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Diante do fim.

Eu caminhava pela calçada quando senti um cutucão no ombro, seguido de uma voz falando: "ei, doutor, me salva um careta?". Respirei fundo, não se aborda ninguém por trás. Pensei por uma fração de segundo, meti a mão no bolso para tirar minha carteira de Marlboro e me virei para trás. O rapaz não deveria ter mais do que 15 anos, era muito magro e a arma que segurava apontando para a minha cabeça parecia ser mais pesada do que ele poderia aguentar.

"Calma", pensei comigo mesmo.

Geralmente, quando caminho só, costumo indagar sobre essas questões existenciais, o sentido da vida, de onde viemos e essa porra toda. É bem como quando fazemos discursos imaginários no espelho do banheiro, nos sentindo Lênin falando para milhares de pessoas prestes a começar uma revolução.

Por algum motivo - talvez por ter uma arma apontada à minha cabeça -, "a vida passou diante dos meus olhos". Eu só conseguia pensar no livro eu que não havia terminado de ler, na trilogia do De Volta Para o Futuro que eu ainda não tinha deixado na locadora, no lixo que eu não tinha colocado para fora (Lúcia ia me matar se o lixo não estivesse fora à noite).

Nas minhas caminhadas pensativas, eu nunca tive idéias tão desesperadoras, calmas e racionais como naquela fração de segundo em que eu tinha uma overdose de pensamentos com um moleque me apontando uma arma.

Pensei em como seria morrer, se eu sentiria alguma dor, se alguém ainda se lembraria de mim daqui a dez anos. Indaguei se Deus realmente existia, não senti vontade de rezar ou de clamar piedade divina, apenas me perguntei como seria o mundo sem mim. Cheguei à conclusão de que seria o mesmo, de o quanto a morte é banal e comum quando se trata dos outros, mas tão importante quando é a nossa. Somos egocêntricos e nos importamos mais com nós mesmos: não que isso seja um defeito, é apenas ser humano.

O que mais me chateava era saber que tudo continuaria como sempre, que poucas pessoas lamentariam de verdade a minha morte, que a festa seguiria sem mim. Mas não havia outra escolha senão aceitar o que seria inevitável.

"Bora, caralho, me passa logo a porra desse cigarro", agora não havia mais doutor em sua frase, seu lábio superior estava levemente contraído e seus olhos expressavam raiva.

Tirei a carteira de cigarro do bolso e entreguei a ele. Ele pegou, deu meia volta e saiu apressado.

Fiquei lá, aliviado por estar vivo, mas desesperado por continuar respirando após as indagações que haviam surgido naquele instante diante do fim.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Breve ensaio sobre a vida

Convido a madrugada para entrar, para fazer companhia à minha solidão. Minha carteira de cigarro está vazia, bem como minh'alma. A tristeza do meu ser não está ligada ao fato de estar só, mas de amargurar o fardo que é pensar.

(Usarei a primeira pessoa do plural agora, caso não se importe, pois suponho que você, assim como eu, também pense)

Procuramos desesperadamente o sentido da vida, razões para continuar respirando. O instinto de sobrevivência nos impede de pular da janela do 13º andar. (Pergunto-me quem sentiria falta caso eu o fizesse). O fato de nascer é um peso em nossas costas, pois com ele temos que viver, e se estamos vivos temos que morrer.

O religioso se apega a deus: o verdadeiro religioso - aquele que é apenas religioso, e não hipócrita - tem sua vida voltada ao momento da morte, espera morrer inconscientemente, pois para ele morrer significa ir para o lado do seu criador. Eu, tendo enterrado minha crença em deus, fujo da morte.

A idéia de que não há nada após a morte além de 7 palmos de terra é desesperadora, mas igualmente é a idéia de que não há fim, de que tudo não passa de um breve momento que decidirá o que ocorrerá pelo resto da eternidade.

Somos frágeis, precisamos de crenças e de superstições para suportar a idéia de morrer. Quando nos falta [crenças e superstições], muitas vezes o desespero bate à porta. E de repente a vida nos parece banal, sem razão. No fim das contas somos apenas macacos evoluídos procurando o sinal do wi-fi em um shopping center. Somos uma mera obra do acaso, insignificantes perante o universo.

Então, perguntam-me, qual o sentido da vida? Respondo: pagar as contas no fim do mês e mergulhar no ópio para anestesiar a dor que é viver.

(Viver não é simplesmente existir, é questionar sua existência, mesmo que isso signifique perder uma parte da sua sanidade).