sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Minha loucura.

Por vezes penso mil vezes e me mantenho na inércia, outras vezes (como diria a música) faço duas vezes antes de pensar. Talvez eu seja louco, talvez eu seja são até demais. Sou impulsivo em momentos da minha vida que requerem meditação; quando a situação pede uma atitude espontânea acabo congelando. É aquela questão de fazer a merda certa na hora errada.

Faço uma loucura ali e outra acolá. Tomo decisões de última hora das quais arcarei com as conseqüências pelo resto da vida. Me preocupo com coisas simples e não ligo para as coisas importantes. Às vezes pareço mais inteligente do que sou, ou mais burro do que pareço. Vai de como eu acordei e de como você me vê. Se um louco diz que não é mais louco, não passará de loucura aos olhos dos outros.

Não sou uma metamorfose ambulante, não mudo de opinião como quem muda de camisa. Posso rever meus conceitos e aprimorá-los, ou mesmo perceber um erro e tentar mudar. Eu simplesmente sou assim. Não tenho respostas e nem frases prontas para tudo.

Tenho medo de ficar louco de verdade, de me internarem num manicômio. Porém, tenho quase a certeza de que a minha loucura é a única coisa que me mantém a sanidade nesse mundo.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Refúgio.

Acendi meu cigarro. Mais um. Traguei a fumaça como a noite tragava o céu. O frio batendo na janela e o som da chuva quebrando o silêncio. Eu costumava gostar disso. Estar perdido nos corredores dos meus pensamentos. Minhas lembranças escondidas atrás de portas vermelhas. Frações de mim e de quem sou. O refúgio que ainda tinha, um refúgio para me esconder da realidade.

Enquanto meus passos ecoavam no enorme corredor, abri uma das portas. Uma especial, guardando uma das minhas lembranças preferidas. O cheiro de poeira e livros velhos encadernados em capas duras e de páginas amareladas. Aquilo me vinha à mente. Era meu esconderijo, atrás da estante de literatura francesa na biblioteca da escola.

A grande estante de metal era como se fosse uma muralha, meu castelo; Camus, Sartre, Molière, Dumas e Victor Hugo eram meus cavaleiros, soldados em alerta para me proteger ao menor sinal de perigo.

O toque findando o intervalo ecoava por toda a escola. A porta vermelha se fecha, sou tragado de volta à realidade. Apago meu cigarro. E continuo vivendo.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

A vida.

Sentado numa cadeira de plástico, na calçada de sua casa, apenas observava o movimento dos carros na rua. Cabelos brancos, lembrava-se do tempo de menino que tudo aquilo era terra batida.

Lembrava-se dos amores que houve ao longo de sua vida, de quando se é criança e a única preocupação que existe é ser flagrado espiando a vizinha tomar banho, lembrava-se de quando era jovem e o mundo parecia estar na palma de sua mão, e até quando já era adulto e estar com a mulher e os três filhos era a única felicidade existente.

Hoje era apenas um velho.

Imaginou como teria sido a vida se tivesse ido atrás do grande amor, não ter largado a faculdade para cuidar da família e hoje ser um homem bem sucedido.

Então o gosto dos bolinhos de carne que sua avó fazia lhe vieram à memória, de como sua mãe era preocupada e reclamava de ele estar magro demais.

O bigode de seu pai acima do sorriso amoroso.

O primeiro beijo, o primeiro amor.

A formatura de seus filhos.

A morte de sua mulher.

A vida. Apenas a vida.

sábado, 11 de fevereiro de 2012

Essa pequena.

Ela tem um sorriso singular, desses que é difícil de descrever com um punhado de frases prontas. Um sorriso de bailarina, como se fosse poesia, do qual não é necessário entender, apenas apreciar.

E de repente eu me sinto com sorte. Ela sorriu para mim, um sorriso sincero. Pegou na minha mão, trocou palavras, olhares. Eu a conheci e sinto que ela me conheceu. Sinto que ela me conheceu como eu nunca havia deixado ninguém me conhecer antes.

Sinto-me um navegador em águas desconhecidas, um desbravador do imprevisível. Sinto-me ansioso para conhecer o futuro, o final dessa novela.

Sinto que ainda vou penar com essa pequena, mas o blues já valeu a pena.

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012

Falta.

Sinto falta do seu cheiro, do seu mau humor de quando acorda. Sinto falta do sexo, mas principalmente do depois, de quando tínhamos conversas intermináveis sobre tudo sem trocar uma palavra, apenas com o olhar.

Sinto falta de você adormecendo no meu peito, de acariciar seus longos cabelos e das brigas que tínhamos, fazendo as pazes entre juras de amor.

Sinto falta do nosso primeiro beijo, da nossa música tocando na rádio, dos dias de chuva na casa de praia, do cinema no domingo e do lanche na padaria.

Sinto falta de você. Sinto falta de nós.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Aurora

Aurora de outrora
No instante agora
O tempo perdido
Um amor de libido

Aurora de agora
No instante outrora
O tempo de libido
Um amor perdido

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Taxímetro: O Carioca

Já passava da meia-noite e eu não havia tido quase nenhum passageiro durante o dia todo. Como era domingo, eu ficava no meu ponto: a praia. À noite, na praia, vê-se um pouco de tudo. Gente de todo tipo fazendo todo tipo de coisa. Mas naquela noite São Pedro resolveu aprontar comigo, e caía uma puta chuva.

Eu já tava com meu nariz entupido e só piorou. Quando fui rodar a chave pra acionar a ignição e me mandar pra casa, entra um tipo estranho no carro com uma "mulher" que trabalha na noite. O filha da puta bateu a porta do meu táxi com força, a vontade foi de mandá-lo tomar no cu. Imbecil folgado, nem pra avisar que tava entrando no carro.

Com meu nariz entupido, cheio de catarro, a vontade era puxar tudo e dar aquela escarrada, mas não era o tipo de coisa que se faz na frente do passageiro.

- E aí, patrão, vai pra onde?

Ao perguntar, pensei que seria um bom momento de me reconciliar a Deus e rezei para que fosse um lugar perto, mas Ele devia estar realmente puto comigo, pois o passageiro, num irritande sotaque chiado de carioca, indicou um endereço do outro lado da cidade, na porra de uma favela.

- Podexá... - eu disse, engolindo minha raiva.

O ar-condicionado do carro deixava meu nariz ainda mais entupido, mas não tanto quanto o ódio pelo carioca viado.

- Olha aí, taxista - dizia o carioca, botando a mão na coxa da "mulher" -, lá só tinha traveco, essa aqui era a última mulher... É ou não é uma gostosa?

Olhei pelo espelho retrovisor. Me perguntei como o carioca conseguiria trepar cheirado do jeito que ele provavelmente estava. Ele devia estar tão louco que nem havia percebido que a "mulher" que ele tinha pegado não era tão mulher assim. Não provoquei, turistas, ainda mais os imbecis, dão boas gorjetas.

- Se você tá dizendo, chefe, é porque deve ser.

Carícias e beijos eram trocados no banco de trás do meu táxi. Não falei nada, mas se partissem para algo mais indecente eu corresponderia na violência. Foi aí que vi, pelo retrovisor, algo brilhando na cintura do carioca. O filha da puta tava armado. Deus devia mesmo estar muito puto comigo.

Tinha dado R$43,74 no taxímetro quando cheguei na entrada da favela. E ali eu não era bem-vindo. Outra história que depois eu conto. O carioca desceu sem pagar, e eu com o cu que não passava um fio de cabelo. Se eu cobrasse ele metia bala em mim, se eu não cobrasse seria muita desmoralização. Aí o cara botou a cabeça na janela e disse:

- Taxista, segura aí e deixa o taxímetro rodando, me espera que em 20 minutinhos tô de volta. Não sai daí!

Não respondi, ele deu as costas e entrou na favela. Subi os vidros, rezando para que ninguém dali me reconhecesse. Foi aí que ouvi aquele barulho fazendo eco, o velho barulho de uma .38 sendo disparada. Liguei o carro, eu não ficaria ali mais nem um minuto. Engatei a ré, quando vi o carioca correndo em direção ao meu táxi. Ele parecia realmente puto, entrou no carro antes que eu pudesse ter reação e bateu com força a porta.

- Bora taxista, se manda daqui, se manda daqui!!!

Acelerei e me mandei pela rua, quebrei na avenida cantando pneu e saindo em disparada, cagando para os foto-sensores.

- Que merda foi essa, porra!? -perguntei, gritando e nervoso.

- Aquela... aquele... aquilo não era mulher! Porra, aquilo tinha um pau do tamanho de um elefante! Era um traveco! E nem pra avisar, caralho!!

Me calei, engolindo a raiva e o nervosismo. Tentei esfriar. A porra do carioca tinha passado o traveco, para passar o taxista não custaria nada. Foi aí que a porra toda ficou mais confusa. Ele tirou do bolso uma carteira com distintivo da Polícia Federal. Tirou uma balinha de pó e um cartão, preparou uma carreira na carteira e cheirou.

- Eu te levo pra onde, chefe? - perguntei.

E o filho da puta não respondeu, me deixando na merda. Como ele tinha sentado no banco de passageiro da frente, não tinha nem como eu tirar meu canhão do porta-luvas. O melhor era não fazer nada, só dirigir para longe da favela.

- Pára aqui, taxista - disse ele, uns cinco minutos depois.

Enconstei o carro e o carioca desceu. Estava em frente a uma boate, dessas que só barão freqüenta. Fiquei observando, sem nada fazer. Ele sacava a arma e a carteira de identificação de policial. Mostrava para um casal. O rapaz até fez menção de fugir, mas mudou de idéia ao ter a arma apontada para si. O filha da puta do policial revistou o rapaz e achou pó com ele. Deu-lhe um golpe com o cabo da arma que desmaiou. Para completar, arrastava a jovem para dentro do meu táxi. Ela era loirinha, linda.

Com o namorado desmaiado com o nariz quebrado no chão, a garota chorava ao ter seus cabelos puxados. Dessa vez o carioca entrou pelo banco de trás arrastando a menina. Me mandou ir para um motel que era conhecido na cidade. Lá acontecia coisas que nem o mais pervertido lunático conseguiria imaginar.

Atravessei mais uma vez a cidade, não havia trânsito, cheguei rapidamente sem problemas. Por fora, podia-se ver apenas o que parecia um armazém abandonado. O carioca desceu, dessa vez falou que eu podia ir e ainda me deixou cinco notas de R$100 novinhas. Vi-o descer arrastando a garota, batendo na porta do armazém e entrando. Quando a porta se fechou, passei a primeira e saí dali.

Passei por uns 5 quarteirões, no sexto encostei o carro. Sempre fiz merda por culpa da minha consciência, e aquele parecia ser mais um daqueles momentos que temos a mais absoluta certeza que nos arrependeremos pela possibilidade de dar merda. Desliguei meu táxi, abri o porta-luvas e tirei a minha tímida .32 e a coloquei presa no meu cinto. Saí do carro, fui até o porta-malas e tirei um punhal, um casaco e uma camisa. Amarrei a camisa no rosto e guardei o punhal no outro bolso da minha calça.

Caminhei os malditos seis quarteirões até chegar no armazém. Dei uma batida e um negão vestido só com uma calça de couro abriu a porta. Parecia ser a única pessoa a fazer a segurança dali, lhe apliquei um belo chute no joelho que ele não teve reação. Acertei bem em cheio, a junta do joelho dele voltou. Fratura com osso exposto. Ficou lá, agonizando no chão. E mais ninguém apareceu.

O local era sinistro pra caralho, tinha um grande corredor com vários quartos. Não tinha portas, era tudo muito escuro. Chicotes acariciando peles, gritos de dor e outros gritos xingando. Gente com máscara de couro e piroca de borracha enfiada na bunda. Era o canto mais sinistro que eu podia passar a minha vida sem entrar. Ninguém ligava para a minha presença ali, só ligavam em continuar suas coisas pervertidas.

Como não havia portas, logo foi fácil achar o carioca. Ele tinha amarrado a loirinha na cama, ela estava desmaiada com um pedaço de vassoura enfiado nela. Mas ela parecia respirar. O carioca estava de costas, só percebeu minha presença quando lhe toquei o ombro. O peguei no susto, foi fácil acertar um direto que quebrou o nariz dele e o fez dar uns passos para trás. antes que ele sacasse sua arma, saquei a minha: três tiros no saco dele. Ele caiu. Acertei mais dois tiros, um em cada mão. Agora o carioca, que se achava tão esperto, apenas gritava e xingava, como tantos outros ali.

Eu tava com pena da garota. Ela não deveria ter mais que 17 anos e passava por aquilo. Fiquei ainda mais puto com o viado capado do carioca. Tirei meu punhal e cortei as cordas que a prendiam na cama, tirei o cabo da vassoura que estava enfiado nela e a botei no ombro, levando-a pela rua deserta até o meu táxi. A coloquei no banco de trás e acelerei para chegar ao hospital. Deixei-a na recepção da emergência, não respondi a pergunta alguma e me mandei dali.

E a porra do meu nariz continuava entupido.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Moribundo

O cigarro já estava no filtro
Sua dose acabando
O dia amanhecendo
E o bolero no fim.

Aproveitava seu dia
Como se fosse o último
Só, sem pressa.

Acendeu outro cigarro
Observou suas lembranças
E pensou que talvez
Que apenas talvez
A vida tivesse valido a pena.