segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Dona Maria.

E lá estava dona Maria pendurando as roupas da patroa no varal. E lá ia dona Maria terminar de fazer o almoço. E depois do almoço lá estava dona Maria lavando a louça. E lá ia dona Maria, e lá voltava dona Maria, pra lá e pra cá.

A vida foi dura como é para tantos, mais uma no meio da multidão. Dona Maria tinha o sonho de virar cantora, hoje tinha o sonho de trocar a geladeira.

Perguntava-se onde tinha errado no caminho. Acontece que a gente pensa no amanhã e de repente se passaram vinte anos.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

A grande questão.

Senhoras e senhores, que rufem os tambores! Por favor, gostaria pedir um pouco a atenção de todos para o picadeiro deste humilde blog sem fins lucrativos! O maravilhoso espetáculo está para começar. Uma pergunta feita a tantas pessoas, que possuem tantas respostas diferentes! Pontos de vista que se chocam, opiniões capazes de mudar uma maneira de pensar. O questionamento que, pelo menos uma vez na vida, já nos fizemos, e procuramos incessantemente uma resposta que caiba em nosso estilo de vida, quiçá no senso comum. A questão filosófica atemporal que, desencadeando uma série de outras perguntas, move a razão da existência do homem e do mundo como o conhecemos: o que é a vida?

Faça o seguinte, responda a pergunta em silêncio, demore uns três minutos e finja que está num programa de televisão, que você quer parecer inteligente e se sinta um filósofo prestes a mudar o conceito de razão, por mais clichê que seja a resposta.

Alguém pode dizer que a vida é uma incessante aventura da qual jamais sairemos vivos, (beleza, Bob!), ou que é algo para ser aproveitada até o último suspiro! Carpe Diem, meus amigos! Ou que a vida não passa de samba, que é bonita e é bonita!

Em minha mera opinião, a vida representa uma palavra. Simplesmente isso, uma palavra que define nosso breve momento de existência. Viemos do nada e ao nada voltaremos. Nada este que não somos capazes de imaginar ou compreender, muito menos aceitá-lo como destino. Somos parte de um ciclo natural do qual não conhecemos, procuramos respostas e perdemos noites de sono. Isso até lembrarmos da conta para pagar no fim do mês.

No mais, que desça a cortina.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

E o tempo passa.

A pior sensação do mundo é quando você sente imensa necessidade de chorar, quando no fim do dia a saudade te acerta no estômago e te derruba de jeito, você desaba, mas simplesmente não há mais lágrimas.

É quando você simplesmente se acostuma com a dor, se acostuma com a ausência, com a falta do abraço e mesmo das brigas. Do riso, das brincadeiras, dos momentos sérios. E de repente uma vida inteira de convivência acaba se resumindo a poucas lembranças, que dia a dia vão se tornando cada vez mais distantes.

Você já não sente a mesma coisa quando escuta aquela música ou mesmo quando vê aquela foto. Depois de três anos aquele espaço vazio já se tornou um cômodo que passa despercebido pelos olhos. Mas ainda assim, você sente falta.

A falta da barba rala quando o abraçava, do cheiro de cigarros dos seus cabelos ou quando ele simplesmente pedia um abraço no fim do dia.

Só lamento que, se algum dia eu tiver filhos, eles não terão conhecido a pessoa fantástica que o avô deles foi.

sábado, 17 de setembro de 2011

Medo

Durmo. Sonho contigo e acordo com a realidade. A solidão que me acompanha na minha jornada em busca pela infelicidade não facultativa.

Ao me aproximar, prendo a respiração. Minha boca fica seca e muda, muda pelo medo que não se mede, mas pelo medo de mudar o meu mundo, a minha dor. Medo do futuro e medo que o futuro chegue.

Medo. O pior medo que se tem. Não é o medo do escuro nem o medo de monstros debaixo da cama, é o medo de ficar eternamente no escuro com o monstro do arrependimento, sem ninguém em minha cama. O medo de te beijar e o medo de não te beijar, juntos pelo medo de te perder.

Medo. O medo do vício de amores comprados para abafar meu lamento, afagado em seios desnudos e baratos.

Medo. O medo do fim da noite, quando se tem que dormir e encarar o teto do quarto. O medo de lembranças e de arrependimentos, coisas que fiz e que deixei de fazer. O medo de me arrepender de novo. O medo de decepcionar. O medo de ser decepcionado. O medo de viver sem prazer. O medo de viver sem te ter. O medo de estar vivo sem viver.


__________________________________________________________________________
Texto lapidado, originalmente escrito em janeiro de 2011.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Juventude.

Deitado sobre a grama muito verde, aquele jovem de 15 anos mantinha a cabeça confotável apoiada no antebraço, tragando um cigarro enquanto observava as formas das nuvens no céu.

A vida parecia irreal, um paraíso, perfeita. Não podia ser explicada em palavras. Aquele sorriso não saia dos seus lábios, o cheiro do cabelo loiro ainda estava em suas narinas. Parecia que havia corrido uma maratona, sentia-se cansado, mas relaxado. Não havia muito sol, até poderia dormir ali. O gosto do corpo dela ainda em sua boca, era como se ainda estivesse sentindo seu toque.

Passava a mão no rosto, procurando alguma barba, não havia nada, mas sentia-se homem. Talvez fossem os cigarros que roubara do pai, talvez o corpo magro da vizinha viúva, talvez porque já não brincasse mais com seus carros de brinquedo, era apenas aquela sensação de maturidade.

_______________________________________________________
Texto postando também em agosto, porém de 2009. Gosto muito dele,
pois traduz bem o que eu sentia à época, apesar de hoje ver o quanto eu
era inconscientemente imaturo. Acho que é uma fase que nós, homens,
sempre passamos ao termos novas descobertas, novas experiências.

domingo, 4 de setembro de 2011

Natasha

Quando Ana chegou em casa o dia estava quase amanhecendo. Havia sido uma noite muito difícil. Maquilagem borrada, cheiro de suor, cabelo despenteado, um olho roxo e alguns hematomas na coxa.

Morava num pequeno apartamento de dois quartos. Três andares. Morava no segundo. Subiu as escadas, rodou a chave silenciosamente, abriu a porta e entrou com seus passos leves no apartamento. Não queria fazer barulho. Notou o pequeno e franzino Guilherme, em seus 6 anos de idade, dormindo no sofá em frente à minúscula televisão. Sentiu certa pena do coitado, deveria ter dormido muito tarde esperando a mãe voltar. Deixaria o coitado faltar aula naquele dia.

Foi ao banheiro, trancou a porta e acendeu a luz. Lavou o rosto e observou no espelho a maquilagem desmanchar-se no rosto em direção à pia. Era bonita. Se não fossem os golpes da vida, seria linda. Mais um dia de trabalho. O olho roxo ficaria pior quando acordasse, problema com cliente. Jogou o chiclete fora, sentou-se no vaso sanitário e urinou. Não agüentava mais aquela vida.

Quando entrou no box do banheiro, deixou a água escorrer por todo o seu corpo. Não estava ferida apenas fisicamente, mas emocionalmente. Demorava no banho, como se estivesse lavando toda a sua vida, uma borracha no passado e em todas as besteiras que fez.

Aos 17 anos tudo o que queria era aproveitar a vida ao máximo. Já estava para completar 30. Estava colhendo tudo aquilo que havia plantado. Todos os seus passos não pensados a levaram exatamente onde estava. Enquanto o mundo acabava ela simplesmente dançava.

Quando Guilherme nasceu ela não sabia quem era o pai. Mas precisaria criar seu filho.

Seu corpo, como uma mercadoria usada, já não valia tanto quanto antigamente. O prazer gerou o vício, o vício gerou um fruto, tudo então virou dor. Mas amava seu filho acima de tudo. Estava viva apenas por causa dele. Lamentava isso.

Ana Paula queria morrer, sair daquela vida, entregar-se de vez. Desistir. Era seu desejo, se morresse estaria satisfeita. Mas não podia. Não enquanto tivesse um filho para cuidar.

__________________________________________
Texto originalmente escrito em agosto de 2010.