segunda-feira, 16 de julho de 2012

A Caixinha.

Férias!

Roberto finalmente havia conseguido tirar férias do seu trabalho. Podeira aproveitar bastante, tomar aquele chopp com com o pessoal do futebol e passar o dia assistindo filmes antigos de pernas pro ar. A idéia seria essa se Luiza, sua mulher, não inventasse uma mudança logo nesse período.

Estavam com 7 anos de casamento, tudo às mil maravilhas. Depois da promoção em seu emprego, finalmente pôde se mudar para um apartamento maior. Roberto Filho já estava com 3 anos e Luiza já estava grávida de 3 meses. Precisariam de mais espaço.

Aquele apartamento de três quartos e 70m², o primeiro patrimônio adquirido por Roberto, tinha muitas histórias. Suas noites de solteiro com a turma da faculdade haviam sido homéricas.

Como todo homem, se apegava a tralhas antigas, todas guardadas em um quarto. Luiza estava na casa da mãe, provavelmente fofocando sobre os últimos acontecimentos da família. Sobrou para ele empacotar algumas coisas e - sob pressão - escolher o que jogar fora. "Pelo amor de Deus, Roberto, jogue pelo menos metade dessas coisas foras, não quero essas tranqueiras no apartamento novo!", ainda estavam frescas em sua memória as palavras de sua mulher.

O quarto era uma espécie de santuário de um homem que não havia se desvencilhado totalmente de sua adolescência. Alguns bonecos da Marvel, encadernados de Sandman, jogos de Super Nitendo, camisas e mais camisas do Corinthians, dentre outros objetos cheio de valor sentimental. Sentou-se num banquinho e começou a selecionar tudo o que queria e o que não queria.

Escondida, empoeirada e velha, acabou achando uma caixinha de madeira que havia sumido de vista há pelo menos 10 anos. Sentiu seu coração apertar um pouco, um nó na garganta e uma nostalgia de besteiras de outrora.

Pegou a caixinha, colocou sobre o colo e cuidadosamente a abriu. História de outra vida, de outro Roberto, aquele mesmo Roberto cultivava uma barba falha no queixo e usava um brinco na orelha esquerda.

Dentro da caixinha, um álbum de fotos da Kodak, um abridor de cerveja, um relógio de bolso parado, poesias que havia escrito em folhas de caderno, algumas outras coisas e um isqueiro Zippo. Aquele isqueiro que o levou a outras lembranças.

Aninha, fez uma cadeira com ela no último ano da faculdade. Ela que o havia presenteado com o isqueiro Zippo. Era a coisa mais linda do mundo, possuía cabelos ondulados, negros, olhos verdes. Seu pai era argentino, casada com chilena e ela havia nascido no Peru, sendo que morava no Brasil desde os 2 anos de idade.

Talvez Aninha tivesse sido o grande amor da sua vida. Namoraram três semanas. Roberto se apaixonou por ela após três dias. Primeiro a viu lendo um livro do Camus sentada no refeitório da universidade, depois foram apresentados num barzinho, possuíam alguns amigos em comum e logo foram apresentados. No terceiro dia estavam namorando, no quarto dormiram juntos pela primeira vez após uma garrafa de vinho e alguns LPs dos Beatles.

Estava perdidamente apaixonada por ela. Mas não havia futuro. No quinto dia ela revelou que já estava com uma viagem programada para a Europa, que moraria de vez lá com com sua mãe e seu padrasto, um boliviano intelectual que havia sido chamado para trabalhar na França.

Roberto decidiu que era maduro o suficiente para aguentar aquilo, era adulto e que saberia aproveitar os dias que ela estivesse no Brasil. Foi um namoro de três semanas que só conseguiu se recuperar depois de três meses. Ainda repetiu a cadeira e demorou mais um semestre para se formar.

"Foi o maior erro da minha vida", pensou Roberto, que de vez em quando ainda parava para pensar em Aninhha. "Mas foi um erro delicioso".

Por fim, guardou a caixinha. Decidiu que simplesmente não valeria a pena jogar aquele pedaço do seu passado fora.

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